segunda-feira, 16 de abril de 2012

EGITO ANTIGO

Egito Antigo


            1. A economia e a sociedade
             A história do Antigo Egito se estende por uns 2700 anos, de aproximadamente 3000 a.C. até 332 a.C.  Três “impérios” egípcios sucederam-se, desde o início do III milênio, com a III e IV dinastias - a das grandes pirâmides - até o fim do século XIII a.C., quando desapareceu a XIX dinastia, a de Ramsés II. Se existe uma civilização que, apesar de sua duração, convide a uma exposição de conjunto, na qual bastará assinalar os principais aspectos de sua evolução, esta é a civilização egípcia. 
Por volta do ano de 3100 a.C. o Egito, até então dividido em duas partes, Alto e Baixo Egito, foi submetido ao governo de um só monarca, o primeiro de trinta dinastias de faraós. O Egito veio a ser desse modo a primeira nação unida do mundo, dando um passo decisivo para o estabelecimento de uma civilização duradoura. Associa-se a unificação do Egito ao rei Menés. 
A história egípcia divide-se em três eras principais, o Antigo Império, o Médio Império e o Novo Império, separados por três períodos intermediários.
No Antigo Império, que vai de cerca de 2575 a.C. até 2134 a.C., compreende as dinastias IV a VIII, destaca-se a construção das pirâmides de Giza pelos faraós Khufu (Quéops), Khafra (Quéfren) e Menkaura (Miquerinos). O Primeiro Período Intermediário compreende as dinastias IX e X e a primeira parte da XI. No Reino Antigo, o faraó era o mais absoluto dos monarcas, adorado como um deus e visto como suprema autoridade religiosa, militar, civil e judiciária.
No Médio Império, aproximadamente de 2040 a 1640 a.C., o Egito constituía uma força política e econômica em expansão. Compreende os últimos reis da XI dinastias e as dinastias XII à XIV. O Segundo Período Intermediário vai de 1640 a 1550 a.C.
O Novo Império começa aproximadamente em 1550 e vai até 1070 a.C., com as dinastias de XVIII à XX. Marcou o ponto culminante do país como potência política e a aquisição pelo mesmo de um império, principalmente na Ásia. O Terceiro Período Intermediário vai de 1070 a 712 a.C.
A agricultura formava o grande, inesgotável e miraculoso recurso do país. Cada ano, em pleno verão, saudada por cenas de gratidão e alegria, a cheia do Nilo trazia ao solo gretado pelo calor, a água vivificante e o limo regenerador. Nos meses em que as enchentes do Nilo tornavam os campos incultiváveis, o camponês podia ser convocado para trabalhar nas pedreiras ou em algumas obras do faraó. Por outro lado, nas épocas de enchentes ocorriam festivais e todo o trabalho cessava durante tempo suficiente para que o trabalhador participasse de celebração de grandes festas religiosas. Para o camponês, a vida resumia-se em canseira constante, pobreza, doença e extrema incerteza. Estava à mercê de forças que não podia controlar e muito menos compreender: cheias excessivas ou demasiado escassas, invasões, guerras intestinas, alterações políticas e dependência do patrão. Os principais produtos da terra do Egito eram o trigo, a espelta, a cevada e o linho. O salário do camponês era pago em espécie.
A condição de escravo parece caracterizar unicamente o estrangeiro reduzido à escravidão: aos egípcios que, movidos por dificuldades econômicas ou obrigados pela administração da justiça, cedem ao Estado os direitos da sua própria pessoa; faziam trabalhos domésticos e trabalhavam nas minas.
Os funcionários públicos ocupavam um papel muito importante na sociedade egípcia, cuidando de tarefas como a coleta de impostos, fiscalização da produção agrícola e econômica. Mas talvez o papel mais importante exercido por eles estava nas mãos dos escribas. Os egípcios usavam uma escrita muito complexa, os hieróglifos, e poucos sabiam ler e escrever, ficando essa função nas mãos dos escribas que acabaram tendo uma influência imensa sobre o governo, pois eles mantinham registros de todas as atividades econômicas e religiosas no Antigo Egito. A competência do escriba baseava-se na sua capacidade de criar não só o texto da composição, mas também o equipamento gráfico destinado a traduzi-lo.


2. O poder do faraó
A palavra faraó significa "dono do Egito". Ele estava acima da humanidade e era o deus perfeito. Era o chefe político e religioso e tinha plenos poderes sobre o povo.
A dinastia era hereditária, casavam-se entre irmãos para manter o sangue real. 
O faraó aparece como o deus-encarnado, sua divindade assegurava as obras efetuadas de acordo com um  modelo divino, ou seja, evitar crises suscetíveis de abalar os alicerces do novo mundo. Uma vez que o faraó era imortal, sua morte significava somente a sua transladação ao Céu. A continuidade de um deus-encarnado para outro deus-encarnado e a continuidade da ordem cósmica e social, estava assegurada. 
O faraó, juntamente com os outros membros da organização estatal, constituía o centro mágico, o centro dominador da vida, com o qual se deve tornar uno, e no qual se deve inserir para que a Natureza traga a felicidade à vida. O faraó podia exigir tudo.
A  figura  do faraó ocupa uma  posição central não só no  domínio da religião mas também no da arte e da história do Antigo Egito. Todos trabalham para ele, e dele recebem os meios de sustento; nele se apóiam todas as esperanças religiosas. 
Os elementos mais importantes dos paramentos reais são porém as coroas, cuja variedade se confirma desde os tempos mais antigos. A coroa branca,  símbolo do Alto Egito,  é uma alta tiara de  material macio  que se  torna mais estreita na extremidade superior e culmina numa espécie de intumescência. Por seu lado, a coroa vermelha do Baixo Egito, aparece na forma de uma calota achatada na parte superior, guarnecida com um “caracol” em espiral. As duas coroas juntas constituem a dupla coroa, que qualifica quem a ostenta como soberano de todo o Egito.
Inicialmente o rei mostra-se como Horo, deus-falcão e deus do céu, filho de Osíris; seu primeiro nome aparece como o “nome de Horo”. Em seguida, sob o influxo do culto de Ré, grande deus-sol de Heliópolis, perto de Mênfis, centro do Egito sob o Antigo Império; Horo, na pessoa do monarca, subordina-se a Ré. O rei torna-se Horo-Ré, ou melhor, Ré-Horo. Torna-se assim “filho de Ré” e bem logo esta filiação tende a ser interpretada de maneira concreta. Tal tendência triunfa brilhantemente sob o Novo Império, quando Amon, deus de Tebas, foi associado a Ré por motivos de ordem claramente dinástica sob o nome de Amon-Ré. Então a união carnal entre Amon e a rainha, bem como o auxílio prestado pelo deus e pelas divindades secundárias ao nascimento e à educação da criança, foram não só narradas, mas também representadas nas paredes dos templos.
O rei apresenta-se no exercício  de seus deveres de soberano. Entre estes, o primeiro lugar cabe ao dever religioso. Filho de Ré ou de Amon, o rei sabe, melhor do que ninguém, como exprimir o reconhecimento do Egito aos seus deuses, a fim de assegurar-lhe a permanência de seus benefícios. A religião nacional torna-se, para ele, uma obrigação familiar, aquela que o filho deve ao pai e o herdeiro de um longa linhagem aos parentes próximos ou longínquos. O faraó constituía-se na máxima autoridade religiosa, era sempre ele quem oferecia os sacrifícios aos deuses, embora por intermédio dos sacerdotes. 
Como tinha de ser eterno recebia um túmulo eterno, que perdurasse para sempre, elevando-se em direção ao Céu, como convinha à sua existência eterna que colocava acima de tudo o resto. 
Os Egípcios acreditavam verdadeiramente na natureza solar do faraó. Como o Sol, ele resplandece através dos monumentos mandados construir em todo o país.
Os principais faraós
Djeser (2630-2611 a.C.): O faraó Djeser trouxe para o Egito uma era de ouro para o saber e o desenvolvimento. Ficou conhecido como o faraó que construiu a pirâmide de degraus de Sakkara, a primeira pirâmide do Antigo Egito.  Foi um período de muito desenvolvimento para o Egito, e na corte do faraó se encontrava Imhotep, que desenvolveu os planos de construção das pirâmides que posteriormente foram usados por todos os faraós na construção delas. .
Akhenaton (1353-1335 a.C.): Amenófis IV (seu nome no momento da ascensão ao trono egípcio) foi o primeiro faraó a implantar uma crença monoteísta no Antigo Egito através do deus sol Aton. O culto ao deus Aton não deixava espaço aos outros deuses e o faraó, que mudou seu nome para Akenaton (“Aquele que serve a Aton”) como uma mostra de devoção, proibiu os cultos e fechou todos os templos exceto os devotados a seu deus. O ponto máximo de sua devoção ao novo deus foi a construção de uma nova capital para o Egito, nas terras virgens de Tell el-Amarna. Essas práticas impostas pelo faraó aterrorizaram os sacerdotes que tinham uma influência muito grande no Egito e pensavam que com o novo deus tudo isso iria se acabar. Após a sua morte seu filho, Tutankamon, assumiu o trono egípcio e manipulado pelos sacerdotes acabou com a religião monoteísta e reimplantou as práticas politeístas do Egito; os templos a Aton foram destruídos e a capital Tell el-Amarna também foi destruída sendo transferida novamente para Mênfis a capital do Antigo Egito.
Tutankamon (1333-1323 a.C.): foi um faraó praticamente sem importância, tendo seu curto reinado comandado pelos sacerdotes; sua única prática  importante foi a restauração das práticas politeístas proibidas pelo seu pai. A única obra histórica deixada por Tutankamon foi seu túmulo, o único de um faraó que não havia sido roubado e profanado, trazendo grandes descobertas sobre a vida dos antigos egípcios. 
Ramsés II (1290-1224 a.C.): Ramsés II ficou famoso pelo trabalho que  fez em prol de sua divinização, obra conseguida em vida e guardada para o futuro com seus monumentos. Ramsés II foi o faraó que fez o maior número de estátuas colossais, também esculpiu seu nome em uma infinidade de templos; mas sem dúvida, sua obra mais famosa foi o templo de Abu Simbel, o qual possuía uma estátua com cerca de 21 metros de altura. Um de seus empreendimentos políticos mais significativos constitui a transferência da capital do Egito para um novo local no delta, que foi conhecido como Per-Ramsés, localizado talvez na atual el-Khatana e Qantir. O motivo da mudança foi que a região do delta havia se tornado o polo econômico mais importante do Egito. Por suas realizações o nome Ramsés foi por muito tempo considerado sinônimo de realeza e muitos faraós  posteriormente adotaram esse nome.


3. O universo religioso do Egito Antigo
O Antigo Egito constituiu sempre uma sociedade extremamente religiosa onde não havia separação nítida entre a religião e a política, tal como se conhece no Ocidente moderno. Quando o governante é deus, os assuntos civis e religiosos se processam em conjunto.
O homem do Ocidente coloca a religião em esfera à parte, separando-o dos outros aspectos da sua existência. Isso para um egípcio seria inadmissível. A religião impregnava-lhe a vida toda – social, política e econômica. Para ele, todos os pormenores da sua própria vida e da vida que o cercava – das cheias previsíveis do Nilo à morte acidental de um gato – dependiam inteiramente da disposição dos deuses. O preceito do Novo Testamento “Dar a César o que é de César e a Deus o que é de Deus”, não teria sentido para ele. O seu César era o faraó e o faraó era um deus.
Heródoto considerava os egípcios os mais escrupulosamente religiosos de todos os homens. Nenhum povo alimentou a multidão de inúmeros deuses, seres e objetos sagrados. Nenhum povo construiu para eles templos tão magníficos.(1)
A religião historicamente conhecida resultou da superposição e organização das divindades dos nomos. O dogma nunca foi unificado: em cada santuário o deus local era visto como a divindade suprema e criadora.
À medida que se foi processando e finalmente concluiu a unificação do país, sentiu-se ser necessário explicar as relações entre os deuses, hierarquizá-los e surgiram construções diversas: tríades de pai, mãe e filho (Osíris, Ísis e Hórus; Amon, Mut e Khonsu; Ptah, Sekhmet e Nefertum, etc.), e sínteses teológicas que explicavam a origem do mundo e dos deuses. 
Alguns deuses locais permaneceram puramente regionais, enquanto outros se impuseram a todo o país: Ra de Heliópolis, Djehuti de Hermópolis, Ptah de Mênfis, posteriormente Amon de Tebas.
O primeiro ponto a se examinar na religião egípcia é o politeísmo (religião em que existem vários deuses).(2) Como praticamente todas as sociedades primitivas, o Egito tinha um panteão de deuses muito vasto, tendo um deus para praticamente todos os aspectos da vida cotidiana. Outro ponto da religião egípcia era o fato dos deuses poderem ter as formas zoomórfica (deuses com corpo de animal), antropomórfica (deuses com corpo humano) e antropozoomórfica (deuses que misturavam a forma humana e animal).
A cada um dos deuses egípcios era associada a imagem de um animal. Um espécime, escolhido com critérios especiais, era considerado a imagem viva do deus, o corpo no qual havia decidido habitar para viver entre os homens. Os egípcios não adoravam apenas seres humanos como deuses, muitos animais eram idolatrados como deuses, como é o caso dos gatos, e em certas ocasiões foram encontradas até múmias destes.
Do princípio ao fim da vida religiosa, os egípcios tiveram deuses em abundância. Isso aconteceu porque o país sempre constou fundamentalmente de um aglomerado de pequenas comunidades agrícolas. Cada localidade ostentava a sua divindade especial e quando as comunidades se uniam sob o governo dos faraós não abandonavam os seus deuses particulares, ao invés disso, uniram os vários deuses. As divindades das velhas aldeias juntavam-se aos das comunidades que se destacavam. Os deuses de localidades que subiam ligavam-se às divindades de prestígio firmado.
Quando havia rivalidades, os vencedores, trazendo consigo sua divindade principal, introduziam-na na região submetida, e por vezes, atribuíam-lhe mesmo o primeiro lugar entre os outros deuses.
O desenvolvimento dos cultos populares foi, em geral, tardio. Mas, pelo menos para um deus, que foi Osíris, desde cedo o fervor da massa contribuiu para promover e para expandir o culto.
A lenda de Osíris, morto e esquartejado por seu irmão Seth, chorado, procurado e reencontrado por sua irmã-esposa Ísis, vingado por seu filho Horo, vencedor do assassino, é a única das lendas egípcias que goza de grande celebridade, graças, indubitavelmente, à propagação fora do Egito, na época grego-romana, do culto de Osíris transmutado em Serápis e do culto de Ísis que se difundiu quase por toda a parte no Império Romano.
O mito conta uma história sagrada, quer dizer, um acontecimento primordial que teve lugar no começo do Tempo. Mas contar uma história sagrada equivale a revelar um mistério, pois as personagens não são seres humanos; são deuses ou heróis civilizadores. O mito equivale à narração do que os deuses fizeram no começo do Tempo. O mito de Osíris, aparece como o principal do Antigo Egito. Eis aqui uma de suas versões: 
“Geb (Terra) e Nut (Céu) deram a luz a Osíris, Seth, Ísis e Néftis.
Osíris era o rei dos habitantes do Nilo, muito poderoso e muito bom. Induziu os seus súditos a viverem em paz e ensinou-lhes a trabalhar a terra.
Ísis, sua esposa-irmã, curava as doenças e expulsava os espíritos malignos com magias.
Fundaram assim a civilização e seus feitos e bondade eram ilimitados. O Egito se viu na Idade do Ouro.
Ainda assim Osíris não se sentia satisfeito, queria levar sua missão benéfica a todos os povos do mundo. Um dia ele falou para sua esposa o seu desejo, e partiu, confiando a Ísis a regência do Egito.
Seth, seu irmão maligno, sentia uma grande inveja da virtude e da fama de Osíris e tramava contra seu irmão, querendo usurpar seu trono.
Um certo dia, Osíris regressou com êxito de sua viagem. Seth oferece, então, um grande banquete em homenagem ao irmão, tal festa foi planejada maliciosamente. Eis que a oportunidade pela qual esperava havia aparecido. Mediu secretamente o corpo do bondoso irmão e mandou confeccionar para ele um precioso sarcófago.
Todos os convidados bebiam e se divertiam, quando Seth mostrou a todos o lindo sarcófago, ricamente adornado e realçado com gemas. A admiração foi geral. Seth zombeteiramente ofereceu o ataúde àquele que entrasse nele e o ocupasse exatamente com seu corpo. Foi organizada uma fila, e para todos os que tentavam, o sarcófago resultava grande demais, pois a peça tinha sido confeccionada em amplas medidas.
 “Finalmente chegou a vez do rei. Osíris, que era de grande estatura, entrou no sarcófago e seu corpo ajustou-se perfeitamente. Seth, com a ajuda de mais setenta e dois conspiradores, rapidamente fecha a tampa do ataúde e lacrou-a com chumbo, atirando-o ao rio Nilo, pelo qual desceu ao mar.
Ísis, dominada pela dor, cortou os cabelos, vestiu-se de luto e procurou-o em vão, subindo e descendo o rio Nilo. Mas o caixão havia sido levado pela correnteza até a costa da Fenícia, onde, em Biblos, foi lançado à margem. Uma tamargueira cresceu imediatamente à sua volta, envolvendo o precioso objeto em seu tronco, e o perfume era tão maravilhoso, que o rei e a rainha locais, Melcart e Astarté, descobrindo sua beleza, mandaram cortar a árvore, e com ela fizeram o pilar central de seu palácio.
 Enquanto isso, a desesperada Ísis continuava vagando pelo mundo, quando ficou sabendo por intermédio de algumas crianças, nos arredores de Tânis, que o sarcófago havia alcançado o mar, devido à correnteza daquele braço do Nilo.
Assim Ísis finalmente chegou à Biblos, onde tomou conhecimento da árvore maravilhosa. Sentou-se ao lado de uma fonte, e não falou com ninguém até que dela se aproximaram umas criadas do palácio real. Trançando seus cabelos, Ísis exalou propositalmente um perfume tão forte sobre elas, que Astarté, quando viu e cheirou as tranças, mandou-a buscar. Chegando ao palácio, ela foi recebida e admitida como ama de seu filho.(...)
O rei estava orgulhoso de haver hospedado uma deusa e prometeu a Ísis qualquer coisa que pedisse. Ela, obviamente, pediu ao rei a grande coluna de seu palácio, de onde tirou o ataúde.
Retomou o caminho de volta, mas não resistiu por muito tempo, e, ordenando que a caravana fizesse uma parada, abriu o sarcófago. Quando viu o rosto do marido, os seus gritos de dor encheram o ar.
Tendo ficado sozinha, Ísis tentou de tudo, empregou encantamentos e fórmulas mágicas para trazer o esposo à vida. Transformou-se em falcão e, agitando sobre ele suas asas para restituir-lhe o sopro da vida, milagrosamente ficou fecundada.
Chegando aos braços abençoados do delta do Nilo, Ísis tratou de esconder o ataúde num lugar solitário, entre os emaranhados pântanos do Delta que o protegiam contra os perigos.
Seth, uma certa noite, estava caçando porcos-do-mato à luz da lua cheia, e por acaso encontrou o sarcófago. Ficou furioso e despedaçou o corpo em quatorze pedaços, que espalhou por todo o Egito.
Ísis, com o novo suplício, recomeçou a dolorosa busca dos restos fúnebres do esposo, desta vez ajudada pela esposa-irmã de Seth, a deusa Néftis e seu filho, Anúbis.
Juntou-se às três desoladas divindades mais uma: Toth, o deus-lua, e assim encontraram todas as partes do deus, com exceção do membro genital, que havia sido devorado por um ossirinco.
Recomposto o corpo, Ísis chamou para junto de si a irmã Néftis, Toth e Anúbis e, com a ciência herdada de Osíris, todos envidaram esforços para restituir a vida ao deus. Anúbis embalsamou o corpo, e surgiu assim a primeira múmia, que foi enfaixada e recoberta de talismãs. Nas paredes do sepulcro, em Abidos, foram gravadas as fórmulas mágicas rituais. Junto ao sarcófago foi colocada uma estátua totalmente semelhante ao defunto. Esses ritos, a partir de então, seriam realizados nos sepultamentos dos reis.
Assim Osíris ressuscitou, mas não pôde reinar mais sobre esta terra, e tornou-se o rei do 'Lugar que fica além do Horizonte Ocidental'. Osíris é agora o soberano dos mortos, sentado majestosamente no mundo subterrâneo, no Salão das Duas Verdades, assistido por quarenta e dois assessores, um para cada distrito do Egito, e ali ele julga a alma dos mortos.
Realizado o rito do sepultamento, Ísis voltou a se esconder nos pantanais para proteger-se, e principalmente ao filho que esperava, das vinganças de Seth. Quando Hórus nasceu, a mãe guarneceu-o com todo amor, invocou sobre ele a ajuda de todos os deuses e depois lhe ensinou magia e educou-o em memória do pai. Assim Hórus cresceu e ficou poderoso. Como o dia nascente, seu olho direito era o sol, o esquerdo a lua, e ele próprio era um grande falcão que cortava os céus. Quando ficou maior, Osíris voltou à terra para fazer dele um soldado.
Então Hórus reuniu todos os fiéis do rei traído e partiu à procura de Seth para vingar a morte do pai. Seth e seus fiéis transformaram-se nos mais terríveis e  estranhos animais para fugir à derrota. Hórus mutilou Seth, mas este transformou-se num grande porco preto e devorou o olho esquerdo de Hórus. (...) Vieram então os deuses e levaram a questão ao julgamento de Toth. Foi um processo que durou oitenta anos, ao fim do qual decidiu-se que Hórus seria o senhor do Baixo Egito e Seth Do Alto Egito. 
E tudo isso se passou 13.500 anos antes de Menés, o primeiro faraó do Egito...”(3)
Notas de referência
(1)  MONTET, Pierre. Egípto Eterno. Madrid: Ediciones Guadarrama, 1966.
(2) Alguns pesquisadores acreditam que a religião egípcia era na verdade monoteísta ou henoteísta.


4. O panteão egípcio
O Egito sempre teve como característica um panteão de deuses muito vasto, mas certos deuses, além de Amon e Aton, destacaram-se em importância e valor e vale a pena serem mencionados. Seria errado ver o panteão como sendo inteiramente fixo, pois tratamos de um período histórico que se estende por 3000 anos, durante o qual a maior parte das figura de maior importância e da sua iconografia parecem ter persistido, ainda que as suas relações se tenham alterado.
Principais deuses:
·         AKER - deus representado por um leão com duas cabeças;
·         AKERU - divindade da Terra;
·         ANAT - representada como uma mulher com um escudo e machado;
·         ANÚBIS - surge como o deus fiel dos túmulos e deus dos mortos, sendo representado paradoxalmente por um chacal deitado, pois este animal costumava desenterrar os ossos humanos, e, por isso, as primeira sepulturas eram cobertas de pedras não apenas para marcá-las para a posterioridade, mas para livrá-las dos chacais saqueadores;.
·         ANUKIS (ANQET) - esposa de Khnum, representada como uma mulher com uma alta pluma na cabeça;
·         ÁPIS -  surge como um boi com marcas na pele e disco solar entre os chifres, ou cabeça de boi;
·         ARSAPHES (HERISHEF) - deus de Heracleopolis, representado com cabeça de carneiro;
·         ASTARTE -  introduzida no Egito durante a décima oitava dinastia, também conhecida como “A Rainha do Paraíso”, seu culto algumas vezes é envolvido com Ísis;
·         ATON - deus do disco solar, venerado como o deus criador de Akhenaton;
·         ATUM - em Heliópolis, Atum era considerado o rei de todos os deuses, aquele que criou o universo. Era representado como um rei, ou menos freqüentemente, como uma serpente usando as duas coroas do Alto e do Baixo Egito.
·         BABAI - divindade com cabeça de crocodilo, que devorava as almas condenadas;
·         BASTET (BAST) - deusa da guerra, tinha uma profunda relação com a deusa Mut;
·         BÉS - significava o deus da família e das mulheres grávidas; protegia as pessoas do mau olhado e dos espíritos ruins, sendo muito adorado pelo povo e em muitas casas onde iria acontecer o parto se via sua figura desenhada sobre a cama da mulher grávida. Aparecia como um anão com rosto em forma de máscara e muitas vezes coroas de penas e juba de leão;
·         BUTO (EDJO, WADJET) -  divindade que designava a Lua Cheia, seu célebre oráculo ficava na cidade desse nome;
·         CNUM -  deus que relaciona-se com a criação; ele aparecia reproduzido na figura de um carneiro, animal que os egípcios consideravam excepcionalmente prolífico;
·         GEB (KEB), SHU e NUT - são membros da enéade de Heliópolis; são considerados divindades da terra (Geb), do ar e da luz (Shu) e dos céus (Nut);
·         HATOR -  uma das deusas mais veneradas no Egito, surge como a deusa das mulheres, dos céus e da necrópole de Tebas. Era venerada, pois trazia a felicidade e chamava-se “dama da embriaguez”, sendo muito celebrada em festas. Foi representada como uma mulher com chifres de vaca e um disco solar sobre sua cabeça ou com a forma de vaca ou simplesmente com a cara de uma vaca;
·         HEQET -  deus sapo, associado com Khnum, ajudava as mulheres no nascimento das crianças;
·         HARPÓCRATES -  mostra-se como uma criança nua com o dedo na boca, madeixa de cabelo lateral: membro da enéade de Heliópolis; filho de Osíris e Ísis;
·         HAPY - deus do Nilo na inundação, representado como um homem com papiros na cabeça.
·         HAROERIS -  uma forma de Hórus, identificado com o deus falcão;
·         HARSAPHES - aparece com uma cabeça de carneiro ou forma deste animal: adquiriu importância durante o primeiro período intermediário quando Heracleópolis era a capital norte do Egito; intimamente ligado a Rá, Osíris e Amon;
·         HARSIESIS - uma forma de Hórus, especialmente designada como “Sol de Ísis”;
·         HAT-MEHIT - deusa peixe do Delta, algumas vezes representada como uma mulher com um peixe na cabeça;
·         HÓRUS -  deus do céu, representava as forças da ordem triunfante contra a desordem. Filho de Osíris e Ísis, lutou contra Seth, o deus da desordem, e ao tornar-se vitorioso ganhou o direito de governar o trono egípcio. Os faraós constituíam sua manifestação na terra e apoiavam-se neste seu caráter para governar as terras do Egito Antigo. Sua representação divina era de um homem com cabeça de falcão, ou então apenas um falcão, sendo ele o deus mais importante do panteão egípcio;
·         IMHOTEP - auxiliar do faraó Djeser, foi um homem de feitos notáveis e grande perito nas artes da medicina; também foi responsável pela criação dos maiores monumentos egípcios, as pirâmides. Após sua morte, foi divinizado pelas suas obras e considerado filho do deus Ptah com uma mulher. Imhotp ficou conhecido como o patrono dos escribas, curadores, sábios e mágicos;
·         ÍSIS - deusa mais popular do Egito, representa a magia e os mistérios de todo o país. Foi mulher de Osíris, e quando ele foi morto, ela percorreu pelo Egito em busca dos pedaços de seu amado e o trouxe de volta à vida com a ajuda de Anúbis para poder gerar seu filho, Hórus. Ela também representa a mãe perfeita em sua dedicação. Aparece representada como uma mulher que costuma carregar inscrito sobre sua cabeça os hieróglifos referentes ao seu nome;
·         KHEPRA - deusa que presidia à harmonia cósmica, simbolizada por um escaravelho;
·         KHNUM -  deus do nascimento, que modela o corpo da criança. Era representado como um carneiro ou cabeça de carneiro;
·         KHONSU - deus da Lua;
·         MAAT - constitui a deusa da justiça, representa o equilíbrio e a harmonia do universo da maneira como ele foi criado. Guardiã dos tribunais, aparece como uma mulher que traz em sua cabeça a pluma de um avestruz;
·         MEHEN - deusa serpente que protegia Afu-Ra em sua Barca durante a viagem noturna do Duat;
·         MIN - mostra-se como o deus da fertilidade e patrono do deserto oriental. Aparece com um gorro com duas plumas e fita, mumiforme e ictifálico e com o braço direito levantado com um chicote;.
·         MONTU - deus da guerra, ligado ao boi Buchis de Armant, Carnaque, Tod, Nag el-Madamud. Muitas vezes aparece com cabeça de falcão, disco solar e duas plumas;
·         MUT - representa-se com adorno de cabeça em forma de abutre ou coroas (branca ou dupla), também com cabeça de leoa;
·         NÉFTIS - irmã e Ísis e mulher de Seth, surge como uma deusa guardiã a qual ajudou Ísis a recolher os pedaços de Osíris quando Seth o destruiu. Também ajudou Ísis a trazê-lo de volta à vida. Da mesma forma que Ísis, ela representa-se como uma mulher que traz em sua cabeça hieróglifos inscritos com o seu nome;
·         NEHEB-KAU - serpente divina do mundo inferior, algumas vezes representada com um corpo de homem;
·         NEITH - deusa mais antiga citada pelos textos egípcios, o que pode significar que ela foi protetora do Baixo Egito antes da unificação do país. Deusa da guerra e da caça, muitas vezes relacionava-se em companhia da divindade guardiã Sobek. Mostrava-se com a forma de uma mulher usando uma coroa vermelha (do Baixo Egito), duas setas cruzadas e um escudo na cabeça;
·         OSÍRIS - irmão de Seth e marido de Ísis, é filho primogênito de Geb (a terra) e Nut (o céu) e por isso teve o direito de governar o Egito, mas seu irmão, Seth, por inveja destruiu-o e espalhou por todo o Egito seus pedaços. Ísis e Néftis procuram seus pedaços e o trazem de volta à vida com a ajuda de Anúbis. Por fim ele e Ísis geram um filho, Hórus.
·         PTAH - venerado em Mênfis, tinha um aspecto estranho, uma espécie de múmia, com a cabeça raspada. Do ventre sobressaem dois antebraços que seguram um grande cedro, símbolo da duração da vida. Representava o deus criador, patrono das artes e dos artifícies;
·         PTAH-SEKER-OSÍRIS - divindade composta, incorporando o principal deus da criação, morte e pós-vida, representado como Osíris como um deus mumificado;
·         QADESH - representada como uma mulher embaixo de um leão;
·         RÁ - também conhecido como Ré, representava o deus sol e guardião da cidade de Heliópolis. Quando desaparece no entardecer do horizonte ele é Atum. Tem a representação de uma falcão que clareia a terra durante o dia;
·         RENENUTET (ERNUTET, THERMUTHIS) - deusa da colheita e fertilidade, representada como uma serpente ou uma serpente com cabeça de mulher;
·         RESHEF (RESHPU) - deus da guerra e trovão;
·         SATIS (SATET) - deusa representada como uma mulher usando uma coroa branca com chifres;
·         SEKHAT-HERU - deusa em forma de Vaca celestial, identificada com Ísis e com Hathor;
·         SEKHEM - esposa de Ptah, mãe de Nefer-Tum;
·         SEKHMET - deusa da cólera, era muito temida pois poderia trazer pestes, destruição e morte para o Egito. Os egípcios a veneravam em tempo de guerra para ajudá-los nos combates. Surge como uma mulher com cabeça de leão coroada com um disco solar;
·         SEPDU - existem várias divindades com este nome, umas com cabeça de crocodilo, outras de leão, outras de íbis;
·         SERAPIS - deus introduzido no Egito no período de Ptolomeu, tendo características de deuses do Egito (Osíris) e da Grécia (Zeus);
·         SERKET - deus com a cabeça de escorpião;
·         SETH - por ser um deus imprevisível e caótico, representa os elementos do caos e do deserto. Luta com todas as suas forças contra os inimigos do sol e sempre apóia os faraós, mas em seus momentos caóticos nunca se pode ter certeza de suas ações, como quando em um momento de ciúmes e fúria ele ataca e destrói seu irmão Osíris e depois caça Hórus. Mostrava-se com a cabeça de um animal até hoje não identificado e era o anunciador dos combates;
·         SOKARI - tinha sido o primeiro deus da região dos mortos. Foi destronado por Osíris, por isso sempre furioso. Sua mansão ou região, deserto imenso, tenebroso, povoado de serpentes, por onde a Barca de Ra tinha de ser conduzida por trenós que deslizavam entre paredes abruptas e inóspidas, era o passo mais perigoso;
·         SOBEK - senhor de Sumenu, representado por um crocodilo;
·         TAWERET, TAURIT ou TUÉRIS - tem a forma de hipopótamo e mulher, com patas de leão e cauda de crocodilo, protetora das mulheres grávidas;
·         THOT - deus das escrituras e invocado pelos escribas, é o deus sábio, que representa os aspectos da escrita e da contagem entre outras ciências. Aparece como um homem com cabeça de íbis, ou como um babuíno;
·         THOTH - deus da Lua que acompanhava a Barca até o Além; deus da Palavra criadora e mágica, encarnação dos Amos da Sabedoria, cuja morada era a parte invisível da Lua. Toda a cultura humana era obra de suas inspirações;.
·         TOTE - deus da instrução e da sabedoria, inventor da escrita, vizir e escriba oficial do mundo de além-túmulo, sendo simbolizado ora por um íbis, ora por um macaco babuíno, possivelmente porque a grave expressão facial dos dois animais sugerisse profundeza de pensamento. Associavam-no com a lua;
·         TUM - deus que criou o Céu e fez nascer a vida na Terra, alcançava todos os outros deuses, era livre da morte. Identificado seu corpo com o de Tum, o morto aspirava e proclamava sua natureza incorruptível;
·         UADJIT - deusa-serpente, cujo templo era em Buto, no Delta. Era representada na coroa dos reis egípcios;
·         UP-UAUT - divindade em forma de chacal, que abre os caminhos.
Os egípcios não só pediam aos deuses o que desejavam como também exigiam, através de elementos de ligação entre eles e os deuses, os sacerdotes. Atingiam tal grau de coragem que chegaram a ordenar às Divindades, ameaçando-as: “Se não levares a Barca até ele (ele era o que pagava a inovação; a Barca era a de Ra, que teria que se recolher para que empreendesse o caminho final) arrancarei os fios de vossas cabeças como arrancaria os botões de flor de um lago”.(4)
Notas de referência
(4) O Livro dos Mortos do Antigo Egito. São Paulo: Hemus, s/d

5. O deus Amon
O deus Amon conheceu sua ascensão quando seu adorador, Amenemhat (“Amon está à frente”) atingiu a realeza, por volta de 2000 a.C.
  O nome Amon significa “oculto”. O deus era um ser invisível e um espírito que podia estar presente em toda a parte; ele espalhou-se por todo o país, ajudado pela influência do governo de Tebas. Amon é “grande demais para se questionar e poderoso demais para se conhecer”.(5)
De acordo com o sistema teológico, Amon foi um dos oito deuses da pré-criação do caos, tornou-se o deus na nação. Sendo assim, foi marcado como o deus-Sol Ra, como “Amon-Ra, deus dos deuses”, tornou-se o deus imperador, a divindade universal.
O deus Amon teve uma representação material, às vezes como um carneiro, um ganso ou uma serpente primitiva, mas com mais freqüência como um rei coroado. Quando era representado como rei, a coroa tinha quase sempre duas penas que simbolizavam as duas regiões do Alto e do Baixo Egito. Posteriormente, quando se fundiu com Rá, o deus do sol, a coroa de Amon exibia os raios de sol. Foi erguido o complexo templo de Carnaque, nas vizinhanças de Tebas, em sua honra.
O Sol, particularmente sob um outro nome, era cultuado principalmente porque no Egito sua força irradiava soberanamente; colocavam-no no cimo da hierarquia divina, ou mesmo para torná-lo o beneficiário de uma tentativa de monoteísmo.
É importante destacar que os deuses Re, Atum, Har-akhti e Min também foram chamados de “deus solar”.
Notas de referência
(5) HART, George. Mitos Egípcios. São Paulo: Editora Moraes, 1992

6. A reforma religiosa de Akhenaton e o deus Aton

A característica da religião da XVIII dinastia é a influência do culto do Sol, com o centro em Heliópolis. O faraó, sábio homem do Egito, tinha radicalmente examinado as doutrinas e reinterpretado as velhas crenças, talvez como um resultado das idéias de outros cultos do Sol, importadas da Ásia no tempo dos hicsos. 
O faraó Akhenaton reinou por 17 anos (1379-1362 a.C.), foi a tentativa de estabelecer o monoteísmo. O culto ao deus Aton não deixava espaço aos outros deuses e o faraó, que mudou seu nome, de Amenófis para Akhenaton (“Aquele que serve a Aton”) como mostra de devoção, proibiu os cultos e fechou todos os templos exceto os devotados a seu deus. O ponto máximo de sua devoção ao novo deus foi a construção de uma nova capital para o Egito, nas terras virgens de Tell el-Amarna.
Aton, o deus que beneficiou-se dos esforços de Amenófis IV, não era sua Criação e o mesmo acontecia com o seu culto. Era um deus solar, ou melhor, um aspecto do deus-Sol: e isto era bem importante, pois permitia o aproveitamento em seu favor nas conquistas anteriores da teologia de Heliópolis. Estas foram transmitidas a Amon, sob o nome de Amon-Re; mas a transferência podia passar por uma usurpação e, sob certos predecessores de Amenófis IV, manifestou-se uma propensão para enfraquecer, senão para romper, a associação entre Amon e o Sol.
O rei tentou impor quase um monoteísmo. Na nova religião tinha intenções políticas claras, de exaltação e deificação do rei, filho do Sol: o faraó foi inclusive representado adorando a si mesmo!(6)
Após sua morte seu filho, Tutankamon, assumiu o trono egípcio e manipulado pelos sacerdotes acabou com a religião monoteísta e reimplantou as práticas politeístas no Egito; os templos a Aton foram destruídos, assim como a capital Tell el-Amarna; a capital foi transferida novamente para Mênfis.
Comparada às teologias anteriores, a teologia atoniana chama a atenção pelo seu caráter direto e simples. Aton nunca é representado como um homem, um animal ou um híbrido, mas tal como o Sol, que todos vêem diariamente. Aparece como o disco, ao qual se acrescentam, apenas, símbolos pouco numerosos: a serpente enrodilhada e, na extremidade dos raios voltados para a Terra, mãos que se apossam das oferendas colocadas sobre o altar, ou que apresentam diante do rosto do rei a tradicional cruz ansada, sinal benéfico de “vida”. Assim, o deus age sozinho, sem divindades interpostas. 
Provavelmente, a fé da massa da população permaneceu intacta durante a reforma religiosa de Akhenaton e os velhos deuses de seus ancestrais continuaram a ser cultuados.
Notas de referência
(6) CARDOSO, Ciro Flamarion. O Egito Antigo. São Paulo: Brasiliense, 1982.

7. A vida no além-túmulo
Muito do que se sabe sobre o Egito aparece como resultado da obsessiva preocupação de seus habitantes com a vida após a morte.
A religião era mantida pelas superstições, de tal modo que os mortais não se preocupavam com o fim de sua existência.
Para os egípcios, o além-túmulo significava uma existência corporal, não uma imitação da vida em estado de fantasma. A alma abandonava o corpo no momento da morte, mas esperava-se que pudesse voltar a ele através da eternidade. Era por isso que os egípcios mumificavam os mortos, para que os seus corpos ficassem livres da decadência.
A alma era imortal e de natureza divina, pois mesmo depois de separada do corpo continua a viver, viajando para a Eternidade. Além dessas condições materiais proporcionadas ao morto, precisava ele para sua viagem de uma boa dose de conhecimentos mágicos, para isso usava o Livro dos Mortos.
Na breve transição entre a vida e o além-túmulo, o antigo egípcio era preparado para a eternidade por uma complexa liturgia fúnebre. Centralizava-se esta em torno de um ritual do embalsamento que podia levar até 70 dias para se completar, caso o morto fosse uma pessoas de posses. Para o pobre, um dia ou dois bastavam. Usavam compostos de sais, especiarias e resinas a fim de conservar e secar o corpo eviscerado numa múmia ressecada, que depois enchiam e enrolavam com camadas de linho finamente tecido. 
A essência da religião mortuária do Egito era uma fé universal no julgamento final de Osíris, que presidia à pesagem do coração do morto, enquanto a verdade ocupava o outro prato da balança. Para os que eram mal sucedidos nesse exame, um animal feroz chamado Devorador de Almas ficava à sua espera.
Certos ritos eram praticados em favor do defunto, com este, depois do embalsamento, envolto em tiras mágicas e provido dos necessários amuletos, estava seguro de ter dado o primeiro passo em direção a uma vida tranqüila no Além, para cuja viagem o Livro dos Mortos lhe prestava ajuda a ultrapassar, livrando-o de todas as dificuldades. O livro era colocado junto à múmia ou embaixo de sua cabeça, assim, o defunto venceria todos os obstáculos - monstros, demônios, portas a abrir, etc.
Todo ser humano tinha várias almas (Ba, Akh, etc.) e um Ka (um dom divino) que poderíamos definir com o seu Duplo, o espírito vital que reside nele. Quando o homem morria, as almas recuperavam a própria independência no reino de Osíris e assumiam as formas que preferiam.
O Ka, pelo contrário, mantinha um estreito relacionamento com o corpo em que habitava quando em vida, sempre visitava-o. E por isso era absolutamente necessário que o corpo fosse conservado, porque, do contrário, também o Ka se dissolveria com ele.


8. Os sacerdotes e os templos
Um país rico em edifícios religiosos - não havia divindade no imenso panteão egípcio que não tivesse o seu templo ou a sua capela no interior do templo dedicado a outras divindades - devia possuir um número de encarregados do culto proporcional ao número e à importância desses edifícios.
  Quando fala do sacerdote egípcio, Heródoto realça essencialmente hábitos: 
 “Os sacerdotes rapam o corpo todo de três em três dias, para que nenhum piolho ou outra impureza exista neles enquanto servem os deuses. Os sacerdotes usam apenas uma veste de linho e sandálias de papiro: não lhes é permitido usar roupas ou calçado de outro material. Lavam-se duas vezes por dia e duas vezes por noite com água fria, executam milhares de ritos religiosos, pode dizer-se, mas também gozam de grandes privilégios: não consomem nem gastam nenhum dos seus bens, mas ficam saciados com os alimentos sagrados e todos os dias lhes cabe uma grande quantidade de carne de boi e de ganso e também recebem vinho de uva, mas não podem comer peixe [...]. Não suportam ver favas, porque as consideram um legume impuro. Não há um só sacerdote para cada divindade, mas muitos, e um deles desempenha as funções de sumo sacerdote: e quando um morre, o filho ocupa o seu lugar.” (Heródoto, 2, 37, 2-5.).(7)
  O ofício do sacerdote era difícil, tudo dependia do deus. Os sacerdotes tinham que ser capaz de recitar os hinos, as fórmulas, sua atividade estava calculada sobre o deus.
O acesso ao templo estava reservado apenas ao pessoal especializado, os sacerdotes e os encarregados dos serviços auxiliares. O templo solar adotou uma estrutura totalmente diferente da dos templos destinados ao culto das outras divindades: um amplo pátio a céu aberto, em cujo centro se encontrava um altar sobre o qual eram depositadas as oferendas destinadas à divindade e que, eventualmente, também podia albergar um símbolo solar como o obelisco.
Notas de referência
(7) DONADONI, Sergio (org.). O homem egípcio. Lisboa: Editorial Presença, 1994.


 Bibliografia
CARDOSO, Ciro Flamarion. O Egito Antigo. São Paulo: Brasiliense, 1982.
CASSON, Lionel. O Antigo Egito. Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editora, 1965.
DONADONI, Sergio (org.). O homem egípcio. Lisboa: Editorial Presença, 1994.
HART, George. Mitos Egípcios. São Paulo: Editora Moraes, 1992.
MELLA, Federico. O Egito dos faraós. São Paulo: Hemus, 1994.
MONTET, Pierre. Egípto Eterno. Madrid: Ediciones Guadarrama, 1966.
VERCOUTTER, Jean. O Egito Antigo. 2º ed. São Paulo: Difel, 1980.
O Livro dos Mortos do Antigo Egito. São Paulo: Hemus, s/d.



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