A REVOLUÇÃO
INGLESA DO SÉC. XVII *
Entre os séculos XVI e XVII acelera-se
o processo de transição do feudalismo para o capitalismo, cujo processo teve
início ainda no séc. XI, quando o sistema feudal apresenta os primeiros
sintomas de crise. Este período é marcado pela presença de elementos
capitalistas e feudo-medievais que irão integrar o conjunto das atividades
econômicas.
No setor agrário, apesar de
encontrarmos ainda relações de produção do tipo feudal, há presença uma ruptura
nas relações servis.
A economia mercantil se desenvolve
dentro dessa sociedade feudal, mas é limitada pela estrutura desta. De qualquer
forma acelera-se o processo de capitalização da agricultura, transformando a
terra num bem comerciável no mercado e eliminando as formas de posses feudais.
Os capitais obtidos no
desenvolvimento da economia urbana passam a serem investidos no campo e na
agricultura.
O processo de transformação da
estrutura agrária inglesa teve na distribuição e venda de bens confiscados da
Igreja católica por parte do Estado, seu principal fator de motivação,
beneficiando a pequena nobreza (gentry) especialmente da região sul e
leste da Inglaterra. Outro fator decisivo foi os cercamentos, por meio destes,
tais proprietários aumentaram consideravelmente as áreas necessárias à
agricultura comercial, bem como, os campos destinados à criação de ovelhas,
expulsando os servos camponeses das terras. Enquanto a nobreza proprietária que
havia arrendado suas terras a capitalistas a longo prazo, perdia suas rendas
devido à inflação e as crises durante o séc. XVII, os produtores que integraram
sua produção ao mercado passaram a acumular capitais e reinvestir tanto na
agricultura quanto nas atividades manufatureiras.
A crise dos centros urbanos
estimulou a expansão das indústrias rurais. A indústria inglesa passou a ter
seu segmento principal na produção de tecidos de lã.
O desenvolvimento industrial inglês
foi financiado de diversas formas, entre elas a riqueza obtida de forma ilícita
por traficantes e piratas, dinheiro que a pequena nobreza investiu a partir da
pilhagem de mosteiros e reinvestimentos obtidos a partir da nova agricultura.
No entanto, vários obstáculos se colocaram ao desenvolvimento industrial, um
destes foi à regulamentação imposta pelas corporações, o que resultou no
abandono dos centros tradicionais de produção industrial, por parte dos
capitalistas que passaram a instalar-se em subúrbios ou novas cidades longe do
controle das corporações, ou ainda migraram para as zonas rurais, onde a
mão-de-obra era farta e barata decorrente das mudanças causadas pelos
cercamentos nos campos. Outro obstáculo foi à própria monarquia inglesa, que
tentava preservar a estrutura produtiva em vigor o que impediu o avanço da
produção industrial e conseqüentemente do capitalismo na Inglaterra.
O desenvolvimento do comércio trouxe
a expansão das atividades industriais. A partir da segunda metade do séc. XVI,
os tecidos tornaram-se o principal produto de exportação da Inglaterra, devido
ao caráter protecionista adotado, os impostos cobrados do comércio inglês eram
menores e por isso dava capacidade de concorrência aos produtos ingleses. Mas
foi com a concessão de privilégios a companhia de comércio que transformou esta
atividade numa verdadeira fonte de lucros para o Estado. Estes monopólios
comerciais bem como as indústrias traziam benefícios a um número reduzido grupo
da sociedade inglesa gerava recursos para o Estado, mas trazia prejuízos para
grande parcela da população que marginalizada destas atividades pagavam preços
elevados no mercado interno em razão da exclusividade comercial e industrial.
A sociedade inglesa era de caráter agrário,
com uma estrema segmentação social, o que ocasionava conflitos de classes e
dificulta estabelecer um perfil da estrutura social. Em linhas gerais, podemos
analisa-la a partir de três categorias sociais: a aristocracia, forma da pela
nobreza tradicional, que teve um papel de extrema importância na Revolução
Inglesa, pois sua condição de classe decadente fazia com que dependesse de
favores do Estado, supunha-se que esta se posicionasse ao lado da realeza, mas
alguns nobres tomaram partido do parlamento.
Os nobres latifundiários se dividiam
em proprietários feudais tradicionais (norte-oeste) e os do sul que se tinham
beneficiado pelos cercamentos e expulsão dos camponeses, forneciam lã para os
donos das manufaturas, esses nobres formavam parte da chamada gentry, que com o
passar do tempo tornou-se uma nobreza aburguesada, verdadeiros capitalistas
agrários. A gentry não era apenas uma classe de proprietários capitalistas em
formação, era uma ideologia que se formava e difundia-se. Classe com
inigualável visão empreendedora tinha seu próprio estilo de vida definido pela
moral puritana, que se adaptou de forma extraordinária a conjuntura econômica
da época, ao contrário da alta nobreza. A gentry seria a grande força da
revolução posicionando-se pelo parlamento e contra a monarquia, apesar de estar
à frente diretamente do poder, manipulava os bastidores.
Existia também um grupo social
chamado Yeomen, formado a partir de diversos tipos sociais que tinham em
comum o fato de caracterizarem-se como classe media rural, eram geralmente
arrendatários e ambicionavam uma nova situação social que lhes garantisse a
propriedade da terra, a expansão de seus negócios e interesses.
Apesar dos resquícios sociais do
feudalismo é na crise social e política do séc. XVII, que se esboçou a
estrutura da sociedade da época moderna, com sua extrema segmentação que
eventualmente determinará o conflito social mais adiante.
Manufatureiros, comerciantes e
industriais, enriqueciam com suas atividades, sendo estes os burgueses mais
atuantes.
A exclusão social se agravava à
medida que camponeses que foram obrigados a deixarem as terras onde estavam
estabelecidos na constituição dos cercamentos no meio rural migraram para os
centros urbanos onde desempregados vagavam pelas ruas, piorando a situação das
cidades. Muitos destes desocupados passaram a trabalhar em pequenas manufaturas
que surgiam nas periferias das cidades, como não eram mão-de-obra qualificada
sujeitava-se a longas jornadas de trabalho em troca de salários baixíssimos.
A burguesia e os empresários rurais
não viam com bons olhos esta situação que se estruturava, principalmente o
controle do rei sobre a economia. Assim, grupos capitalistas passaram a reagir
contra o absolutismo do rei, pois temendo conflitos entre os camponeses e os
grandes proprietários tentaram impedir os cercamentos, o que atraiu ainda mais
a oposição da gentry e de setores da burguesia mercantil.
Os aliados do rei neste momento eram
o clero anglicano e a aristocracia do norte e do oeste que tinham seus valores
e modo de explorar de suas propriedades baseados no modelo feudal (uso de
mão–de-obra servil).
O contexto religioso inglês fez com
que a burguesia e os empresários rurais se unissem, pois o Anglicanismo,
religião oficial do Estado inglês servia aos interesses do rei. Assim, a
burguesia calvinista (Puritanos) e os capitalistas agrários passaram a
lutar contra os desmandos do rei absolutista.
Valorizando o trabalho, o hábito de
poupança e a busca do lucro, a ética calvinista atendeu as aspirações da
burguesia, que encontrou no Calvinismo uma justificativa religiosa para
a acumulação de riquezas do dia-a-dia. As ideias calvinistas adotadas e vividas
pelos puritanos ingleses chocavam-se com as ideias do anglicanismo, que tinha
posições contrárias às calvinistas. A gota d’água veio quando o rei tentou
impor uma legislação para regular a religião, enfatizando a forma católica do
anglicanismo em detrimento do conteúdo calvinista, com isso o rei tentava impor
seu poder. Os choques religiosos entre anglicanos e puritanos, que passaram a
polarizar-se como oposição e apoio à monarquia absoluta, chamou-se de Revolução
Puritana.
Após a tomada de poder pelos puritanos,
é no governo de Cromwell que se decreta o Ato de Navegação, que
determinava que todos as mercadorias comercializadas pela Inglaterra só
poderiam ser transportadas por navios ingleses ou do país onde foram
produzidas. Isso impulsionou o capitalismo inglês e favoreceu especialmente a
burguesia mercantil e a indústria naval. Ao mesmo tempo prejudicando a Holanda,
detentora de praticamente todo transporte comercial mundial da época, país com
o qual a Inglaterra entra em guerra de 1651 a 1654. Com a vitória inglesa, a
Inglaterra assume a posição de liderança no comercio marítimo internacional.
Com
o movimento de 1688, a chamada Revolução Gloriosa, completa-se a
Revolução Inglesa que liquidou o absolutismo, estabeleceu um governo
parlamentar que permitiu a ascensão da burguesia ao poder.
Estruturavam-se,
assim, as condições para o avanço econômico que resultaria na Revolução
Industrial. De um lado, uma revolução da agricultura impulsionada pelos
cercamentos que beneficiou a gentry. De outro lado, a expansão comercial e
marítima garantida pelo ato de navegação, que atendia aos interesses da
burguesia mercantil. O caminho estava aberto para a consolidação do capitalismo
na Inglaterra.
Bibliografia:
ARRUDA,
José J. A Revolução Inglesa. São Paulo:Brasiliense, 1988.MARQUES,Adhemar M.,BERUTTI,Flávio C.,FARIA,Ricardo de Moura.História Moderna através de textos. São Paulo: Contexto,1997.
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